Problema no sistema de registro de recebíveis de cartões leva regulador a adotar postura mais cautelosa.
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Por Mariana Ribeiro — De São Paulo
Quase dois anos após a regulamentação pelo Banco Central (BC), o processo de implementação das duplicatas eletrônicas no país segue em aberto. Os problemas verificados no sistema de registro de recebíveis de cartões acabaram atrasando as discussões e levaram o regulador a adotar uma postura mais cautelosa também em relação às duplicatas.
Objeto de lei de 2018, as duplicatas escriturais (ou eletrônicas) foram regulamentadas em maio de 2020. O próximo passo seria a aprovação da convenção das escrituradoras (as registradoras), o que ainda não aconteceu. Só quando for finalizada essa etapa, na qual serão definidos os detalhes para o funcionamento do sistema, entrarão em vigor os prazos definidos para que empresas de diferentes portes se adequem à norma.
“Esse processo está sendo mais demorado do que o esperado em função do que temos aprendido durante a implementação do ecossistema de recebíveis de cartão”, explicou ao Valor o consultor do Departamento de Regulação do Sistema Financeiro do BC Mardilson Fernandes Queiroz.
O sistema de recebíveis de cartões começou a funcionar em junho de 2021, após adiamentos, e teve uma estreia conturbada, com dificuldades de interoperabilidade entre as registradoras. “Como há alguns ‘players’ comuns entre os dois sistemas, eles já estão com os seus esforços direcionados para o aperfeiçoamento do sistema de cartão”, acrescentou o técnico do BC.
No momento, o regulador avalia uma versão da convenção das duplicatas enviada pelas escrituradoras, mas ainda não deu aval ao documento. De acordo com Queiroz, é importante garantir que os participantes estejam prontos para fazer a implementação quando os prazos forem, de fato, iniciados. Algumas empresas do setor acreditam que possam ser necessários ainda ajustes no cronograma.
A ideia é que, quando implementado, o sistema de duplicatas eletrônicas ajude a dar mais segurança da veracidade das operações comerciais por trás do instrumento e a eliminar o risco de o mesmo título ser usado como garantia em mais de uma operação. A expectativa é que o mercado de crédito ganhe força, com aumento de competição e redução de taxas.
Pela norma, o registro deverá ser feito por entidades autorizadas pelo BC. Hoje, há quatro aptas a fazer o serviço: Central de Recebíveis (Cerc), Central de Registro de Direitos Creditórios (CRDC), B3 e Câmara Interbancária de Pagamentos (CIP).
Após a regulamentação da lei, em 2020, elas deram início a um processo de compartilhamento de informações entre si, com o objetivo de verificar a unicidade das duplicatas. O escopo vislumbrado pelo BC, no entanto, é muito maior.
MOVIMENTO FALIMENTAR E CLIPPING DE NOTÍCIAS
Produzido por : Lauro M S Filho - Paraguaçu Paulista / SP, Segunda-Feira, 07 de Março de 2022.
“Hoje, é como se fosse um cartório, a gente centraliza o registro das duplicatas e, através da tecnologia de blockchain, informa que a duplicata está naquela registradora”, explica Rafael Dal Mas, diretor de produtos da CIP. “Com a nova regulamentação, esse escopo vai ser evoluído para uma escrituração, validação de nota fiscal e registro com aplicação de ônus, gravames e troca de titularidade. Juridicamente, é como se eu carimbasse a duplicata.”
Para Marcelo Maziero, sócio-fundador da Cerc, outro avanço do sistema diz respeito à etapa de pagamento, com a introdução de regras para tentar trazer os pagadores (empresas não reguladas pelo BC, como varejistas) para dentro do modelo. Bancos e registradoras deverão fazer parte desse esforço. Com o tempo, o novo sistema deve permitir um acompanhamento mais preciso do instrumento.
“A partir de certo ponto o mercado financeiro só vai operar com duplicata escritural. Tudo o que você quiser saber sobre um documento vai estar no local onde foi escriturado”, explica. A Cerc registra duplicatas desde 2018 e, no ano passado, foram transacionados mais de R$ 61 bilhões.
Embora não sejam esperados efeitos imediatos após a implementação, os participantes acreditam que o sistema deve beneficiar empresas, especialmente as médias, e incentivar a entrada de novos participantes no mercado. Para Queiroz, do BC, a infraestrutura desenvolvida para o compartilhamento de informações proporciona um “campo fértil” para novos modelos de negócios.
A Liber, marketplace de antecipação de recebíveis que conecta fornecedores de grandes e médias empresas a uma rede de financiadores, é uma das empresas que vislumbram um crescimento do setor a partir da introdução das duplicatas escriturais. Victor Stabile, CEO da fintech, destaca que esse mercado teve forte crescimento nos últimos anos, impulsionado por fatores como atividade econômica, juros baixos e maturidade do setor.
Segundo dados do Banco Central, em janeiro o estoque das operações envolvendo desconto de duplicatas e recebíveis somava R$ 159,2 bilhões. Um ano antes, estava em R$ 111,7 bilhões.
“A próxima pernada de crescimento vai vir com a duplicata escritural”, afirma Stabile. A empresa, que movimentou R$ 17,2 bilhões em 2021, vê com otimismo também o avanço do open banking. “Temos a missão de entrar em outros produtos de crédito.”
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